O Mal

O mal caiu sobre minha casa, atingiu em cheio a minha família toda, pegou a gente desprevenido, e não tinha mais como escapar! Meu pai rezava o rosário, pedindo para Deus alguma coisa, e eu já havia acendido um punhado de incenso, já havia ouvido um punhado de mantras que aprendi a gostar. E é tanto mal, mas tanto mal, que já nem sei se quero viver, não neste mundo, e nem desta forma. O mal está se espalhando para todo mundo poder ver, e isso parece estar dentro de um estatuto e de uma norma. Minha irmã foi fazer exame ontem, parece que tem o que tenho, e ela não merece um diagnóstico desses. E quem merece? Eu me sinto um desgosto e então me empenho, para não lembrar as palavras, de um pai para um filho que padece: "Podia ter feito a vida, se não gastasse sempre com doença". E isso não me dói vindo do meu pai, me dói vindo da vida. Meu pai é um homem bom e não merece tudo isso. Para completar a desgraça acompanhei na TV a despedida, dos mortos na boate de Orlando, e não posso ficar omisso. E toda essa história de que no Brasil não existe político honesto? O mal está é se espalhando, não está apenas no meu ambiente doméstico, é tanta gente querendo o mal e o desejando. Ninguém mais consegue se ver como um ser humano igual. O homem é o próprio predador do homem. O homem é o seu próprio mal. São as próprias vitórias que eles consomem, o seu próprio fracasso de espécie. E eu sou um entre tantos desses humanos fracassados. Um homem de 23 anos, branco e brasileiro, que não se esquece, que acima de tudo é um ser humano com os pés amarrados, um humano igual ao negro, igual ao pardo, igual ao gay ou ao muçulmano. Eu sou um homem que preza muito o ser humano. E eu não consigo parar de pensar naqueles que morrem, pela homofobia, pelo racismo e pelo ódio cultural, não consigo pensar que há os que dormem, morrendo de frio nas ruas, isso é normal? Tenho medo desse mal que cerca todos e a tudo. Esse capitalismo mortal que faz o rico e faz o pobre. Sou mais um covarde hipócrita inserido neste mundo, que se justifica pela fobia de um jeito esnobe. Sou um covarde que faz jus a minha espécie fracassada. E esse medo ou fobia não deve ser uma justificativa, não posso revolucionar apenas com uma palavra pensada, tenho que propagar tudo isso em ações de minha prerrogativa! Deixei esse mal se apossar da minha cabeça, de homem bissexual e socialista. Está na hora de parar de ver televisão, tenho que ler um pouco mais para não ser apenas um idealista. Me recuso a acreditar que a humanidade não tem jeito. Me recuso a aceitar que o mal vá mudando as formas. Existe mais amor do que ódio, e isso é perfeito, começo por mim algumas boas reformas.  Não discriminar, não ficar apenas falando mas fazer. Existe muita coisa para se falar e amar, existe tanta coisa boa para acontecer. Existe o mal mas existe a esperança. Esperança de que um dia o homem se reconheça como uma classe, e que dentro dela aconteça uma grande mudança, ninguém seja somente alguém que nasce, homem, mulher, LGBT ou negro, seja apenas um humano por direito, um humano por dever, nem maior e nem menor do que nada, sem defeito, exatamente igual a tudo aquilo que é de matéria e tem que ser. Esse mal entrou na minha casa, mas não vai corromper o meu coração.

By: Vinicius de Góis
Feito em 14 de Junho de 2016.

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